domingo, 28 de fevereiro de 2010

A Teoria da Incomodação Zero

Domingo passado, resolvi jantar uma comidinha natural e saudável, aqui no Cassino. E enquanto esperava que aprontassem o xis-calabresa, fiquei folheando uma Zero Hora que estava por ali. Encontrei um texto muito interessante, de Juliana Salbego, Publicitária e Professora do Curso de Comunicação Social da Unipampa.

Eu nunca tinha ouvido falar do assunto (embora óbvio) que essa Professora abordou: a existência de uma "Teoria da Chateação Zero", ou "Incomodação Zero", segundo a qual os empregadores preferem os profissionais que "não incomodam". Os que não contestam, não reclamam, estão disponíveis para trabalhar a qualquer hora, e transigem em seus direitos trabalhistas. Por consequência, pessoas com esse perfil tem mais chance de "fazer carreira".

Achei bem interessante, pois isso acontece claramente. E não só na dita iniciativa privada, mas no serviço público também. Convivi com isso toda minha vida. E senti as consequências dessa "Teoria" inúmeras vezes, pois nunca me enquadrei no perfil de cordeiro. Mas nunca tinha ouvido falar que isso chegou ao ponto de gerar uma "Teoria".

Dizem que os mansos são bem aventurados, porque herdarão a terra. Pelo jeito, além de herdarem a terra, progredirão no serviço também. Os comentários na página digital da ZH onde foi postado esse texto são, na sua maioria, tristes, na base do "é isso aí mesmo", "é preciso satisfazer o empregador", etc.
Deve ser por isso que tem tantas pessoas se enquadrando nesse perfil.

Acho até que, nunca antes na história desse país, houve tanto pelego por aí ...

Mas o negócio é o seguinte: tenho que puxar o assunto para minha área, da segurança pública, e as relações são infinitas, sobre a "Teoria da Incomodação Zero" atuando em nosso meio. Não vou discorrer aqui, por motivos que bem podem ser imaginados, embora coubesse, sobre o perfil das pessoas que os governadores geralmente escolheram para ... deixa para lá.

Vou a outro ponto: a Pesquisa "O que pensam os profissionais da segurança pública, no Brasil", que mencionei um tempo atrás, indicou que grande número de policiais não denunciaria colegas que cometem atos ilegais. Sendo mais claro, uma minoria se dispõe a denunciar colegas corruptos.

Examinando a questão no meu universo de convivência, acho que esse comportamento também se amolda à tal teoria da "Incomodação Zero". A vontade de não se incomodar é o maior combustível da corrupção.

Nestes onze anos como policial, já encontrei colegas que não gostavam de receber denúncia de corrupção em seus setores. Isso pode ser notado, aliás, no hábito de enviar (chutar) para a Corregedoria muitas denúncias que o próprio superior hierárquico poderia imediatamente apurar, e na sequência, punir. Só que isso é difícil, faz nascer inimizades, incomoda.

Pior que isso, não são raros também os famosos "vira-canoa", em que por algum motivo misterioso o denunciante vira denunciado.

E os subordinados sabem isso, que muitas vezes denunciante é tratado como treze*. Se ele é que incomoda, ele é que perturba, então é ele o "errado". Acaba acontecendo que o melhor é não denunciar. Denunciando, incomoda. Não denunciando, fica tudo bem.

Mas eu, como já disse, nunca me enquadrei nesse perfil de cordeiro. Para mim, quem tem razão, nesse ponto, é o Protógenes, quando diz que quem trabalha para bandido, bandido é. Quem se omite quando deveria deter o bandido, também.

Reproduzo adiante, então, o texto da Professora Juliana Salbego. Boa leitura.

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"A TEORIA DA INCOMODAÇÃO ZERO

Os homens se distinguem dos animais, não porque têm consciência, já afirmavam teorias sociológicas do fim do século 19, mas porque produzem as condições de sua própria existência. Estas condições são, em grande parte, oriundas do trabalho, que sempre fez parte da vida humana. Contudo, desde que surge a propriedade privada capitalista, a relação de trabalho estabelecida entre empregador e empregado passou por muitas transformações.

O trabalho consistia em sinônimo de segurança, de um ambiente ordenado, regular, confiável e duradouro. Em uma época não tão distante, o imediatismo não figurava como valor maior, e a lógica do trabalho se assemelhava a uma construção: tijolo a tijolo, andar a andar, no trabalho lento, que findava com uma obra sólida e firme – a carreira.

Mas hoje o status do trabalho parece estar subvertido ou, ao menos, tem se revestido de características muito distintas das de outrora. O sociólogo polonês Zigmunt Bauman nos revela que o novo perfil do trabalhador, buscado pelas empresas, não é mais exatamente aquele que prima por um sujeito íntegro, enraizado em valores, com princípios e tradições sólidas. O mais novo filtro utilizado nesta escolha é de outra natureza. De acordo com Bauman, desde 1997, usa-se nos EUA uma expressão que designa o perfil de trabalhador que o mercado procura, o chamado “chateação zero”.

A expressão cômica, mas extremamente reveladora, nos mostra que o trabalhador que possuir menos fatores potenciais para chatear ou incomodar a empresa durante o seu labor será aquele com maior chance de conseguir a vaga. Por exemplo, um sujeito dotado de família e filhos tem o seu nível de chateação elevado, pois provavelmente não terá tanta flexibilidade para aceitar tarefas em qualquer horário ou local.

Ora, se você é um empregado que ousa questionar as relações e que procura cumprir as suas obrigações, cobrando dos demais o mínimo de responsabilidade, saiba que você possui um nível de chateação elevadíssimo. Vantajoso é ser alguém descomprometido com a realidade social, com laços afetivos frágeis e que possa estar sempre à disposição.

A preferência é por “empregados ‘flutuantes’, acríticos, descomprometidos, flexíveis, ‘generalistas’ e, em última instância, descartáveis (do tipo ‘pau pra toda obra’, em vez de especializados e submetidos a um treinamento estritamente focalizado)”, afirma Bauman. O mercado de trabalhadores é também um mercado de produtos.

Neste ambiente “líquido-moderno”, estendemos o retrato da prática do consumo para as demais instâncias da vida, como parece ocorrer com as atividades do trabalho. Uma predileção pela facilidade, desprendimento e individualização. Um produto é comprado, usado até perder o valor e depois descartado, pois uma imensidão de outros estará à disposição. O trabalhador assume, enfim, o status de descartável. Incomodando zero, disponível sempre e criticando nunca."

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Formatura da Ana Paula

Hoje às 19h, no Theatro Guarany, em Pelotas, nossa filha Ana Paula Silva Moura estará colando grau em Design Gráfico, pela Universidade Federal de Pelotas.

Eu, Djanira, e a Luísa, estamos transbordando de satisfação. É o coroamento do esforço de uma menina que desde os 17 anos está morando longe da família, na batalha para realizar seus sonhos.

É com muito orgulho que lembramos como foram superadas todas as dificuldades, não só da distância, para chegar nesse momento, e com toda a felicidade que festejamos este momento tão importante nas nossas vidas.


Temos certeza que a Ana Paula será tão bem sucedida na vida profissional, daqui para a frente, como foi em tudo o que fez até hoje.

A ti, Ana Paula, os merecidos parabéns.
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Saudades do Direito Alternativo

Logo depois de me formar, em 1993, ganhei uma bolsa parcial na Ajuris, que na época ficava ainda no 12º andar do Shopping Rua da Praia, Rua dos Andradas 1001, Porto Alegre. Ainda estava na Caixa Federal, então saía do serviço e ia direto para a aula. Lá, aprendi muitas coisas, e desanimei com outras tantas.

Tive aulas com professores daqueles que vale a pena só ficar escutando. Rui Portanova, por exemplo, que na mesma época tinha lançado um livrinho que deveria ser obrigatório em todos os cursos de Direito: "A Motivação Ideológica da Sentença". No mínimo, para todos os jovens juízes do Estado.

A maioria dos professores, no entanto, prendia-se àquelas vertentes formalistas, que engessam a construção da jurisprudência, e à própria realização da justiça. Notei que valia mais, para a maioria dos professores (pelo menos naquela época), a forma que o conteúdo da decisão. Isso era transparente. O curso era de dois anos, mas desisti após concluir o primeiro semestre. Vi logo que não era a minha praia.

Esse período, no entanto, valeu a pena por ter sido aluno, além do Portanova, do Márcio de Oliveira Puggina, uma pessoa extraordinária, Juiz de Direito interessado em verificar como as decisões judiciais importam, concretamente, na vida das pessoas, e a partir daí aplicar a jurisdição.

Márcio Puggina foi um dos fundadores do Direito Alternativo, e marcou época quando era juiz em Santa Rosa, e ao decidir um caso, sentenciou "deixo de aplicar a lei, nesse caso concreto, pois o resultado seria injusto". E ensinou que a jurisdição não se prende somente à aplicação da lei, friamente, como se vê cada vez mais nos dias de hoje.

O dizer o direito se embasa em conceitos muito mais amplos, nos quais o juiz deve se basear. Se a lei não resolve de forma justa a questão, deve ser deixada de lado, passando então o julgador a se embasar nos princípios gerais do Direito. Para quem não conhece o Direito Alternativo, recomendo uma pesquisa no Google. Um rápido entendimento pode ser conseguido aqui.

Eu acho que aprendi alguma coisa nesse breve convívio. Márcio Puggina foi uma pessoa dessas cuja ausência é sentida, neste nosso vale de mediocridades. Se ele tivesse conseguido prosseguir, certamente teria contribuído muito mais, ainda, para a humanização do Judiciário e para a sociedade brasileira.

Guardei por muito tempo o recorte de uma coluna do Correio do Povo, no qual ele falava das importantíssimas funções do Judiciário, após a redemocratização. E também das muitas garantias que o texto constitucional conferia aos magistrados, para que pudessem livremente "dizer o direito". Essa coluna era de 1989, muito antes que o conhecesse pessoalmente, então quando fui seu aluno, já era um fã. Nunca mais achei esse texto. Deve estar perdida dentro de algum livro velho.

O texto em questão encerrava com uma frase lapidar, para a época: "O Judiciário deve ser, agora, o operário da sua própria reconstrução".

Para mim, o Judiciário brasileiro falhou nessa reconstrução. Uma prova disso são as palavras do Ministro Joaquim Barbosa, figura ímpar no Supremo Tribunal Federal, em entrevista ao jornal O Globo, no dia 03.01.2010, que eu pesquei do Cloaca News, e reproduzo adiante.

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"O ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal (STF), há dois anos ganhou notoriedade por relatar o processo do mensalão do PT e do governo Lula. Em 2009, convenceu os colegas a abrir processo contra o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) para apurar se ele teve participação no mensalão do PSDB mineiro. Em entrevista ao GLOBO, Joaquim não quis comentar o mensalão do DEM, que estourou recentemente no governo de José Roberto Arruda, do Distrito Federal. Mas deixou clara sua descrença na política e sua dificuldade para escolher bons candidatos quando vai votar. E o ministro, de 55 anos, não poupou nem os tribunais: “O Judiciário tem uma parcela grande de responsabilidade pelo aumento das práticas de corrupção em nosso país”.

O Globo: Por que aparecem a cada dia mais escândalos envolvendo políticos? A corrupção aumentou ou as investigações estão mais eficientes?

JOAQUIM BARBOSA: Há sim mais investigação, mais transparência na revelação dos atos de corrupção.Hoje é muito difícil que atos de corrupção permaneçam escondidos.

O Globo: O senhor é descrente da política?

JOAQUIM: Tal como é praticada no Brasil, sim. Porque a impunidade é hoje problema crucial do país. A impunidade no Brasil é planejada, é deliberada.As instituições concebidas para combatê-la são organizadas de forma que elas sejam impotentes, incapazes na prática de ter uma ação eficaz.

O Globo: A quais instituições o senhor se refere?

JOAQUIM: Falo especialmente dos órgãos cuja ação seria mais competente em termos de combate à corrupção, especialmente do Judiciário. A Polícia e o Ministério Público, não obstante as suas manifestas deficiências e os seus erros e defeitos pontuais, cumprem razoavelmente o seu papel. Porém, o Poder Judiciário tem uma parcela grande de responsabilidade pelo aumento das práticas de corrupção em nosso país. A generalizada sensação de impunidade verificada hoje no Brasil decorre em grande parte de fatores estruturais, mas é também reforçada pela atuação do Poder Judiciário, das suas práticas arcaicas, das suas interpretações lenientes e muitas vezes cúmplices para com os atos de corrupção e, sobretudo, com a sua falta de transparência no processo de tomada de decisões.Para ser minimamente eficaz, o Poder Judiciário brasileiro precisaria ser reinventado.

O Globo: Qual a opinião do senhor sobre os movimentos sociais no Brasil?

JOAQUIM: Temos um problema cultural sério: a passividade com que a sociedade assiste a práticas chocantes de corrupção. Há tendência a carnavalizar e banalizar práticas que deveriam provocar reação furiosa na população.Infelizmente, no Brasil, às vezes, assistimos à trivialização dessas práticas através de brincadeiras, chacotas, piadas. Tudo isso vem confortar a situação dos corruptos. Basta comparar a reação da sociedade brasileira em relação a certas práticas políticas com a reação em outros países da America Latina. É muito diferente.

O Globo: Como deviam protestar?

JOAQUIM: Elas deviam externar mais sua indignação.

O Globo: É comum vermos protestos de estudantes diante de escândalos.

JOAQUIM: O papel dos estudantes é muito importante. Mas, paradoxalmente, quando essa indignação vem apenas de estudantes, há uma tendência generalizada de minimizar a importância dessas manifestações.

O Globo: A elite pensante do país deveria se engajar mais?

JOAQUIM: Sim. Ela deveria abandonar a clivagem ideológica e partidária que guia suas manifestações.

O Globo: O próximo ano é de eleições. Que conselho daria ao eleitor?

JOAQUIM: Que pense bem, que examine o currículo, o passado, as ações das pessoas em quem vão votar.

O Globo: Quando o senhor vota, sente dificuldade de escolher candidatos?

JOAQUIM: Em alguns casos, tenho dificuldade. Sou eleitor no Rio de Janeiro.Para deputado federal, não tenho dificuldade, voto há muito tempo no mesmo candidato. Para governador, para prefeito, me sinto às vezes numa saia justa. O leque dos candidatos que se apresenta não preenche os requisitos necessários, na minha opinião. Não raro isso me acontece. Não falo sobre a eleição do ano que vem, porque ainda não conheço os candidatos."
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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Matando cavalos, fechando cinemas, usando veneno vencido

Uma das principais funções dos blogs, como "meios de comunicação", é veicular notícias escondidas pela grande mídia, ou oferecer pontos de vista diferentes sobre fatos que são noticiados, porém com aquele viés mal-intencionado, de endeusar alguns e demonizar outros.
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Tenho procurado cumprir minha função, nesse sentido, sempre que posso. Assim, quero chamar a atenção dos leitores para o fiasco que tem sido a administração da Secretaria da Cultura do RS, (fiasco esse previsto por quem é do meio, na época da nomeação da Secretária para-quedista que atualmente ocupa o cargo). As duas ultimas da titular da Secretaria são bem emblemáticas do que se passa naquela cabecinha.
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Ao mesmo tempo em que fecha uma sala de cinema das mais importantes do Estado, na Casa de Cultura Mário Quintana, que consta estar em plenas condições de funcionamento, e exibe filmes fora do circuito comercial (atividade instrinsicamente cultural, portanto), a Secretária Mônica Leal saiu a cavalgar, na dita "Cavalgada do Mar", na qual as montarias estão morrendo pelo esforço excessivo. Bota cultura nisso.
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Isso passou batido na grande mídia, sem nenhum comentário ao menos. Mas pode ser conferido aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e principalmente aqui.
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De outro lado, os resultados da calamitosa gestão de Osmar Terra frente à Secretaria da Saúde também tem sido poupados de críticas. Mas pode ser conferido nos blogs, como aqui e
aqui.
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Em nível nacional, uma barbaridade esta semana, a tentativa de criação de mais um factóide, chamando o finado Zé Dirceu para cena, e tentando colar a imagem dele na da Dilma, acabou desmoronando sozinha. Mas a RBS continua a repetir a mentira. A verdade, nesses casos, pode ser vista aqui, aqui, aqui.
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Não é sem motivos, portanto, que os blogs que trazem a verdade sobre os fatos escamoteados recebem grande fluxo de leitores, como o Cloaca News, o qual ultrapassou semana passada à marca de um milhão de visitas.
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Na barra lateral direita, há links para blogs que eu visito sempre. Nesses blogs, há links para outros, que eles recomendam. Então, buscar saber mais sobre as notícias é muito fácil. Basta querer.
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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Agora é a Dilma!

"Naqueles anos de chumbo, onde a tirania parecia eterna, encontrei nos versos de outro poeta - Mário Quintana - a força necessária para seguir em frente:

"Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho."

Eles passaram e nós hoje voamos livremente. Voamos porque nascemos para ser livres."

Dilma Roussef, no 4º Congresso Nacional do PT


Posto adian
te o discurso da companheira Dilma Roussef, no 4º Encontro Nacional do PT, no qual foi lançada oficialmente como pré-candidata a Presidente da República. Vale a pena ouvir nossa futura Presidente.



Parte 1




Parte 2




Parte 3




Parte 4



sábado, 20 de fevereiro de 2010

Blues da Piedade

O tempo não para

Esta noite, liguei a televisão, e estava passando o filme do Cazuza. Assisti de novo o finalzinho, ele cantando "O Tempo Não Para". Acho que essa foi a última vez que ele cantou.

O Cazuza, não só pela música, mas pelo modo como viveu, faz a gente pensar. Até morto ele chama a atenção. Por exemplo, circula pela internet um e-mail de uma suposta psicóloga, que critica a permissividade dos pais, comportamento que teria levado o filho a uma vida desregrada, e na consequência, às drogas e à AIDS.

Sei não, sei não ... até acho que essa senhora pode ter alguma razão ... mas por outro lado, nestes anos todos já vi, mais vezes que gostaria, pais presentes, dedicados e fazendo tudo o que seria "certo", perderem filhos para as drogas. E por outro lado, pais péssimos, alcólatras, viciados, e até abusadores às vezes, terem filhos caretíssimos. Isso parece mais uma grande - e boba - loteria.

De qualquer forma, Cazuza foi o poeta maior da nossa geração, disparado. O poeta que cantava, para esse povo que não gosta de ler. Então, posto adiante "Burguesia" e "O Tempo Não Para", que pesquei no You Tube. Mas eu gosto demais, também, de "Faz Parte do Meu Show", "Blues da Piedade", "Codinome Beija Flor", "Brasil", "Ideologia", e outras tantas. Não tem mais quem faça músicas assim.

Ah, e só para não passar batido, vai também uma lembrança da sensibilidade da Veja (ô revistinha) ao tratar da sua doença. Para quem não viveu aquele tempo, ou não lembra, isso não é montagem. A capa é verdadeira, por incrível que pareça, e a chamada marcou época: "Cazuza, uma vítima da aids agoniza em praça pública". Precisa dizer mais?



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Paixão

Já que estou em Pelotas, um pouco de Kleiton & Kledir. Pra ti, Djanira.



quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

As influências alheias na Polícia Civil

No meio do ano de 2003, fui transferido para Dom Pedrito, assumindo a Delegacia daquela cidade. Estava lotado, antes, na Delegacia de Feitos Especiais da Corregedoria-Geral de Polícia, e queria na verdade ir para Pelotas, mas ouve algumas influências alheias e fui parar lá na Capital da Paz, onde acabei ficando por cinco anos.

Ao assumir a Delegacia, tomei conhecimento de uma situação, que para quem é de fora (não é policial) parece “surreal”, mas não surpreende a quem é do meio.

Havia na Delegacia um policial que estava lá há alguns, mas era de Livramento. Ele tinha família, mulher e duas filhas, também naturais da cidade vizinha. E queria desesperadamente ser liberado para retornar à sua cidade original, principalmene porque lá tinha uma casa de sua família para morar. Para um policial, que ganha pouco, economizar 300 ou 400 reais no aluguel é muito significativo, no orçamento familiar.

Depois de anos tentando a transferência, ele desistiu. Sempre diziam que não podiam liberá-lo sem que viesse outro policial para seu local. E para Dom Pedrito ninguém queria ir (e ainda não quer).

Só que a mãe do rapaz, uma senhora já idosa, ficava incomodada com aquilo, que para ela era uma injustiça, pois muitos outros policiais que haviam ido para Dom Pedrito depois de seu filho já haviam sido transferios, e ele ficava sempre para trás. E esses colegas, invariavelmente, conseguiam a transferência com algum político da cidade para onde queriam ir.

Então, em uma atitude desesperada, ela escreveu uma carta para o Secretário da Segurança da época, o José Paulo Bisol, pedindo que tivesse pena de seu filho. Só que a senhora era tão ingênua que mandou essa carta quando o Secretário já não era mais o Bisol, e sim o José Otávio Germano. Caindo a carta lá na Secretaria da Segurança Pública, o diligente novo Secretário mandou o documento para a Chefia de Polícia, que pelos canais competentes, instaurou sindicância contra o rapaz. O motivo: utilização de influência política para obter vantagem pessoal.

A base legal da sindicância foi um artigo do Estatuto dos Servidores da Polícia Civil, com a seguinte redação: “Interpor ou traficar influências alheias à Polícia, para solicitar acessos, remoções, transferências ou comissionamentos” (Lei Estadual nº 7.366, artigo 81, I).

É claro que, na sindicância, o rapaz foi “absolvido”, pois ficou comprovado que nem mesmo sabia da atitude de sua mãe. Mas sofreu um bom tempo, naquela angústia de quem, sendo inocente, não sabe se será punido ou não, procura advogado, planeja a defesa, etc. E só quem passa por esse tipo de aperto sabre o quando é difícil dormir, sem saber o que acontecerá amanhã. Depois, ele ainda continuou por mais um tempo “no ferro” lá em Dom Pedrito, antes de conseguir sua carta de alforria.

Não sei se esse artigo citado, do Estatuto da Polícia, é utilizado com frequência, na instituição. Tenho para mim que não, pois é sabido que são lamentavelmente frequentes as influências “alheias”, para transferência deste ou daquele servidor, muitas vezes exitosas.

E, deixemos claro, essas interferências externas, não ocorrem somente para beneficiar algum policial bem-relacionado, mas muitas vezes para prejudicar colegas, como nas tentativas de represálias a agentes ou delegados que, pela natureza da profissão, tenham se opostos a interesses escusos de figurões locais.


A história da Polícia Civil está repleta, por exemplo, de pedidos (ou exigências) de Prefeitos indiciados pedindo transferência de Delegados, Escrivães ou Inspetores.

Dependendo do caráter de quem está nos cargos de comando, essas influências prosperam ou não. Quando as chefias são ocupadas por homens e mulheres dignos da sua função, ciosos de sua posição institucional, e esse tipo de pedido “entra por um ouvido e sai pelo outro”. Mas às vezes, infelizmente, ocorre de haver pessoas menos firmes em cargos importantes, e nesse caso, existe até pressa em atender as “demandas”.

Em tais situações, não é difícil de ocorrer favorecimento a policiais “peixes” de políticos, como promoções ou lotações imerecidas. E muito menos difícil ainda, ocorrerem represálias contra policiais “incômodos”, na forma de transferências de cidade, troca de Delegacias, diminuição da remuneração de Delegados (pela retirada de substituições), e outras formas de assédio moral.

Temos muito a evoluir antes que a Polícia Civil possa se apresentar à sociedade como uma verdadeira Instituição. Uma Instituição com letra maiúscula. Vedar, verdadeiramente, interferências externas sobre decisões administrativas, especialmente as relativas a recursos humanos, talvez seja a primeira medida, nesse sentido.

Para mim, isso seria muito simples. Era só adotar aquele antigo slogan da política anti-drogas do Bush pai: Just say no. Basta dizer não. Honrar a profissão o suficiente para fazer isso: dizer não.
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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

A Crise na Polícia Civil

Reproduzo adiante texto publicado no blog Flit Paralisante, editado por um colega Delegado da Polícia Civil de São Paulo, Roberto Conde Guerra. A leitura é muito interessante também para nós, policiais civis gaúchos. Eu assino embaixo.
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Os grifos são meus. Leiamos a reflitamos ...
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A propósio, o Delegado em questão tem sofrido muitas represálias por manter o blog, rechado de denúncias de corrupção. Recentemente, houve busca e apreensão de seus computadores, e há uma demanda judicial para que o blog seja fechado. Eu apóio o colega paulista. Estou colocando um link na barra lateral, para que os muitos colegas que passam por aqui possam visitá-lo mais facilmente.
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A CRISE NA POLÍCIA CIVIL
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Vivemos um enorme problema na segurança pública de São Paulo, e digo isto em alusão direta a Polícia Civil paulista, principalmente a que está estabelecida na Capital (conhecida como DECAP).
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O problema não é apenas de cunho salarial (que é imprescindível), mas também de cunho funcional, como podemos constatar claramente pela ineficiência do sistema de investigação, ao qual deveria se basear todo o ato da Polícia judiciária (Polícia Civil).
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Mas para que os atos investigatórios se tornem eficientes, toda a estrutura corruptível, estabelecidas na forma de favores e cargos políticos precisaria ser desmantelada. Enquanto a cúpula da polícia for formada por Delegados empossados em seus cargos, por apadrinhamento político e não por competência, e enquanto os deslocamentos de funcionários das delegacias se derem a “bel prazer” (vejam as publicações diárias de transferências de funcionários nos Bics), sem qualquer motivação operacional, apenas para a manutenção da estrutura viciada e corrupta ou por mera perseguição pessoal, não haverá condições da Polícia civil exercer sua atividade primeira, que é a Investigação Policial, pois a estrutura funcional estaria comprometida nas atitudes temperamentais de alguns de seus membros, que se acham donos e mandatários eternos da instituição, por serem afilhados de algum político.
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A estrutura vigente na atual Política de segurança pública, não se baseia na investigação policial, está mais preocupada com a aparente estrutura de atendimento e de policiamento ostensivo, não se preocupa com os esclarecimentos dos crimes, que são em si a base maior contra a impunidade. Diga-se de passagem, a criminalidade aumenta, não por falta de policiamento ostensivo nas ruas, mas por falta de uma polícia voltada para a apuração dos crimes, com o comprometimento de fazer-se um instrumento de justiça, tirando da sociedade o que ela mais teme, o sentimento de impunidade, que só faz alimentar a violência.
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A polícia Civil caberia o papel mais importante, que é o da investigação dos crimes, mas este papel foi colocado de lado pelas administrações que se sucedem, e que não veem que o que habilita a policia civil como instituição é o seu papel investigativo, é o que a difere da Polícia Militar, mas que porém, vem sendo colocado de lado por alguns de seus membros, por motivos e interesses pessoais e políticos, pondo em risco a própria instituição, pois se não ousamos constituir como prioridade nossa prerrogativa de investigar, deixamos em aberto esta possibilidade para outras instituições que o queiram fazer (Ministério Público e a própria Policia Militar), pela importância que tem esta atribuição.
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Alguns podem dizer que existem instrumentos para investigação, como alguns departamentos especializados, mas quem vive no meio policial, sabe que não é verdade, e que isto de longe não é o suficiente, pois a máquina continua viciada e mal aproveitada, pois apesar das delegacias especializadas (DEIC, DHPP, DENARC) exercerem atividades investigativas, elas também estão sujeitas as mesmas incertezas e má administração das Delegacias de Bairros, além do que, também não possuem estrutura para arcar com a demanda de crimes a serem esclarecidos, pois também estão sujeitos a funcionários apadrinhados, que muitas vezes não possuem qualificação, ou mesmo vontade de exercerem a função investigativa, apenas querem estar numa posição em que possam se utilizar do cargo em proveito próprio.
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A verdade é que a Polícia Civil de São Paulo, no que tange principalmente a capital (ainda existem em algumas pequenas cidades do interior boas administrações), está desmantelada pela incompetência administrativa de alguns de seus membros, que estão mais preocupados com seus cargos e benefícios pessoais, do que em fazer da Polícia Civil uma instituição respeitada pela sociedade e melhor para a maioria de seus membros, que dão a vida por ela e não são reconhecidos.
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Vivemos hoje em todas as Delegacias da capital, e também em muitas outras do interior, o desvio de função; quase 70% dos Investigadores de Polícia estão lotados em Plantões, em atividade de atendimento ao público, ou mesmo apenas como vigias de prédios de Delegacias, tudo isto em detrimento da investigação. Como podemos exigir uma diminuição da impunidade criminosa, se aqueles que deveriam ser os responsáveis pela investigação e apuração dos crimes, para que a justiça seja cumprida, estão sendo utilizados em funções e em atividades divergentes aquelas que são de sua competência. Como podemos aceitar que uma instituição que foi criada para ser o braço investigativo do judiciário, não contemple com condições e respeito as suas atribuições, seus próprios funcionários (Investigadores de Polícia), que são possuidores de tão importante e necessária competência.
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A Polícia Civil de São Paulo necessita de uma grande reformulação, de pessoas que tenham interesse em fazer dela uma força investigativa, que é o motivo de sua existência como instituição, e que seus membros vejam que agindo apenas pelo interesse pessoal ou pela política, ou mesmo utilizando-se de restrições aos seus membros no exercício de suas atribuições primeiras (Investigação), conduziram a Polícia Civil à estagnação funcional, deixando aberta a porta para que outras instituições roubem sua maior prerrogativa, sua maior atribuição, a INVESTIGAÇÃO POLICIAL.
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Borracha contra ideologias

Olhando o Tomando na Cuia de hoje, lembrei desse antigo cartum da Mafalda. Na sabedoria da pequenina, Quino nos mostra a "borracha de apagar ideologias". Isso no tempo em que os cacetetes eram de borracha. Hoje é pau puro. Enfim, essa é a borracha com a qual eles pensam que apagam ideologias ...

É lamentável que alguns oficiais continuem colocando a Brigada Militar nesse triste papel de adversária da população civil, e carrasca dos trabalhadores. Tem gente por aí (e não é só na Brigada) que não percebeu que esse governo já acabou, e continua querendo fazer média com o andar de cima, praticando sem moderação o receituário tucano de, mais que criminalizar, tratar os movimentos sociais como inimigo.

A insituição não existe para isso, e sim para que cada policial seja um garantidor dos direitos humanos - o direito à vida, à integridade física, à segurança e à liberdade, inclusive e principalmente a liberdade de organização e expressão.

Para mim, e a maioria dos trabalhadores brasileiros na segurança pública (conforme recente pesquisa do Ministério da Justiça), já passou da hora de debatermos seriamente a desmilitarização da Brigada.
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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Estórias para crianças

Ando bem atrapalhado, sem conseguir atualizar o blog, como antes. Então, na falta de coisas novas, vou postar alguns textos antigos, só para não perder a freguesia. Vai lá um texto publicado no Jornal Folha da Cidade, em Dom Pedrito, no ano de 2007. É um recado para quem tem filhos pequenos: aproveitem o dia, como dizia o cara aquele do filme.

ESTÓRIAS PARA CRIANÇAS

Eu sempre gostei de contar estórias para minhas filhas dormirem, quando elas eram pequenas. E como percebi que elas tinham fases, às vezes de querer todos os dias a mesma estória, outras vezes de exigir que fosse diferente da noite anterior, desenvolvi uma técnica de manter mais ou menos o mesmo enredo, mudando apenas os personagens.

Assim, contava para elas, num dia a estória do lobo mau e dos três porquinhos, no dia seguinte, a do gato mau e dos três ratinhos, depois, do porco mau e os três lobinhos, do rato mau e os três gatinhos, e por aí afora. Também fazia inversões, como no caso do lobo bom e os três porquinhos maus, o gato bom e os três ratinhos maus. Cada inversão permitia fazer vozes diferentes para os personagens, inventar características diferentes, tudo de forma a interagirmos, enquanto o sono não chegava. Era muito bom.

Depois de um tempo, deu até para começar a improvisar, contanto histórias da minha própria infância, com alguma finalidade educativa, como: “Era uma vez um menino chamado Josezinho Renatinho, que não gostava de tomar banho ...”, ou inventando personagens, para despertar a curiosidade das gurias, do tipo: “Era uma vez um ratinho que queria muito voar, então fez um aviãozinho de papel, e com uns arames o transformou numa asa delta ...”.

Acho mesmo que o importante não era qualidade do enredo, mas sim a interação, a convivência, a demonstração de que, naquele momento, toda a atenção do pai era exclusiva para elas. Afinal, passamos o dia todo dando atenção para os outros, para o chefe, o patrão, os clientes, pacientes, amigos, a militância ... e os fillhos, que deviam ter prioridade, são às vezes esquecidos, talvez justamente por estarem tão próximos.

Se não tomarmos cuidado, pode acontecer que nossa relação com as crianças seja apenas o seu sustento, e o fato de morarmos na mesma casa. E acharmos que vão se educar sozinhas, ou que isso é responsabilidade da escola. Nem vão ser educadas por outras pessoas, que não os pais, nem a educação é responsabilidade dos professores. Professor é para ensinar, mas a educação tem que vir de casa.

Tenho certeza que coisas simples assim, como contar estorinhas para dormir contribuem, e muito, para a formação das crianças. Quinze minutos por noite, é o que basta para contar algo que as faça dormir felizes, e ainda com o bônus de despertar a curiosidade para a leitura, como quando a gente utiliza algum livrinho com figuras.

Já andava meio esquecido disso quando, assistindo a minissérie Amazônia, lembrei da minha tristeza com o assassinato do Chico Mendes, anos atrás, e como contava para minha filha mais velha as aventuras do homem que amava as árvores, e protegia a floresta, os animais, os seringueiros e os índios(*).

Claro que eu fazia isso tirando o peso da luta de classes, que crianças devem ser poupadas disso. Nada de mencionar mortes ou matadores de aluguel, mas sim colocar o herói e seus amigos como os defensores da floresta, contra os malvados. Aliás, o Chico Mendes era bem isso, mesmo.

Mas reconheço que não conseguia fazer isso todos os dias. Não fui um pai perfeito, se é que isso existe, também tive minhas fases de ausência. Mas na média, acho que fui um bom pai, pelo menos nesse quesito de contar estorinhas. Agora, que as gurias cresceram, me dou conta que quem mais ganhou com aqueles momentos fui eu mesmo. Essa experiência, eu recomendo.

(*) Daqui duas semanas minha menininha se forma em Design Gráfico, na UFPEL. Eu já tinha contado isso, mas não faz mal nenhum repetir ...
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sábado, 6 de fevereiro de 2010

Ainda o Avatar

Eu já estava achando que não tinha nenhum tipo de mensagem aproveitável no filme Avatar, quando recebi um e-mail do Padre Alex, mandando um texto de Luciano Pires, pessoa que não conhecia, que me fez pensar novamente na questão. Desse ponto de vista, que minha "tosquice" não tinha deixado perceber, há realmente uma mensagem. Vai lá então o texto.

I SEE YOU

O filme Avatar, que está estourando os recordes de bilheteria, tem um enredo tão antigo quanto a história da Humanidade. Um soldado é enviado para aprender os costumes dos inimigos e facilitar que eles sejam derrotados. Mas se apaixona por uma inimiga e muda de lado. Um dos momentos fascinantes é quando o soldado aprende a saudação dos inimigos: "I see you". "Eu vejo você". Esse "ver" não quer dizer "enxergar",mas conectar-se com o interior do outro. É muito bonito.

Lembrei-me do "I see you" quando pensei em escrever um texto sobre o Haiti. Puxa, mas todo mundo já escreveu sobre o terremoto! Então o Cônsul Geral do Haiti em São Paulo surge dizendo que a tragédia foi boa, pois assim o mundo prestaria atenção neles...


Pois é. Como são insignificantes nossos vizinhos miseráveis, não? Só sabemos deles quando uma tragédia acontece. Foi preciso um terremotogigante pra gente dizer aos haitianos: "I see you". Finalmente o mundo olhou pra eles. Mas como é que olhamos pra eles?

A televisão já nos treinou para as tragédias, portanto imagens de corpos soterrados, resgates dramáticos e brigas por comida até chocam, mas já não estarrecem. São parte de uma estética familiar. Na revista Veja sobre o terremoto, por exemplo, entre a foto do corpo abandonado de uma criança sobre um pneu e a foto dos destroços de um prédio, havia um milionário encarte de seis páginas de uma montadora, em papel especial e cheio de cores: compre um carro novo!

Será que vemos o Haiti como um espetáculo? E o calhorda embate político ideologizando a tragédia e suas conseqüências? O mundo contra os Estados Unidos - e seria contra quem? - que teriam enviado para o Haiti soldados e dinheiro demais, além de tomar conta da coordenação [aqui eu, José Renato, humildemente discordo; o triste papel dos EUA, de se aproveitar da situação para ocupar militarmente um local importante na "geopolítica" continental é bem nítido, para mim, e as críticas são justas].

E o que deveria ser uma ajuda humanitária sem coloração política transformou-se em mais um embate contra o imperialismo ianque. Pergunto se àquele garoto que perdeu a família e estápassando fome, essa discussão interessa. Será que vemos o Haiti como ferramenta política?

Poucos dias após a tragédia a Embaixada do Haiti em Brasília recebeu pedidos de mais de 200 brasileiros interessados em adotar uma criança. Tenho uma infinita admiração por quem escolhe adotar um filho, mas não consigo deixar de pensar que, pretinho por pretinho, o Brasil tem milhares. E branquinhos. E pardinhos. Todos vivendo sua tragédia particular, precisando de comida, de um lar, de educação e de amor. Mas nenhum deles tem a sorte - olhe só, "sorte"- de um terremoto como tiveram os órfãos do Haiti. Será que vemos o Haiti como uma oportunidade?

Pois é. Nossos vizinhos miseráveis são irrelevantes, só sabemos deles quando uma tragédia acontece. Diferente dos Na'vi do Avatar, nosso "I see you" para os haitianos não é o de um ser que conecta-se com outro. É o do telespectador que, no intervalo comercial, tem certeza que a tragédia só acontece com os outros.

Luciano Pires
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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Avatar, Dança com Lobos, Ken Parker


Assisti o Avatar, e não achei nada demais. Tirando os efeitos gráficos, não há nada de excepcional no filme. Até me esforcei para achar a tal semelhança do carinha lá com o Che Guevara, que um americano encontrou. Quem escreveu isso, ou viu outro filme, ou não manja nada da história do Che.

Para mim, não se trata nem, ao menos de uma obra que defende a ecologia, a defesa da floresta contra o desmatamento, ou coisa que o valha. É apenas a repetição da formula batidíssima do romance entre o homem-branco e a filha do cacique americano. Em muitos momentos, achei que estava assistindo "Dança com Lobos", ou lendo uma história do "Ken Parker", cujo nome não lembro mais.
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Serve como entretenimento, pelo menos, pois as imagens são belíssimas. Hoje, pretendo assistir "Lula, o Filho do Brasil", no cinema do Cassino. Outro dia, quando for possível, eu conto como é.
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terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

É preciso pautar a Reforma Agrária


Reproduzo adiante texto muito esclarecedor, de Leandro Fortes, publicado aqui na Carta Capital, que focaliza o tema que realmente interessa: a reforma agrária.
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Não há atualmente no Brasil discussão alguma sobre a reforma agrária. O assunto está resumido à grande imprensa, com uma campanha midiática contra o MST e a favor do agronegócio (leia-se latifúndio), que por estar na pauta há pelo menos duas décadas, soterrou a discussão original, qual seja concentração de terras (muitas mal-havidas) nas mãos meia dúzia de ricaços. Os partidos de esquerda, aparentemente, abandonaram o debate.
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Do texto em questão, faço apenas uma ressalva de opinião pessoal: para mim, o MST não tem concepção socialista. Ao contrário, o desmembramento da terra conquistada em pequenos lotes individuais, modelo brasileiro da reforma agráfia, é formador de pequenos capitalistas, não de novos socialistas. Esse é um ensinamento antigo, dos primeiros tempos da revolução soviética.
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Mas que a terra é o principal meio de produção, disso não há dúvida. Sua posse, mesmo em uma sociedade não-socialista, deve ser democratizada, até por questões de inteligência econômica.
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Quanto mais propriedades rurais houver, mais riqueza vai circular. Com isso, maior será o consumo, e ocorrerá geração de mais postos de trabalho, no tal "ciclo virtuoso" que o Lula falava antigamente. A consequência direta da desconcentração de renda no campo é a melhoria da qualidade de vida das pessoas e das comunidades. E o exemplo concreto está na diferença de padrão entre as cidades do norte e do sul do Estado, correspondentes ao tamanho das propriedades e diversidade dos proprietários. É só olhar e ver.
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Recomendo também a leitura o
Partisan, que trata de manifestaçao da Pastoral da Terra sobre a "espetacularização" das prisões de integrantes do MST, como desdobramento da ocupação da CUTRALE. São dois pesos e duas medidas. O Dantas não pode ser algemado e mostrado na televisão. O pessoal ligado ao MST, pode.
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Segue então o texto do Leandro Fortes:
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A prisão de nove lideranças do MST, no interior de São Paulo, algumas das quais filiadas ao PT, foi o ponto de partida de uma estratégia eleitoral virtualmente criminosa e extremamente profissional, embora carente de originalidade. Trata-se de perseguição organizada, de inspiração claramente fascista, de líderes de um movimento que diz respeito à vida e ao futuro de milhões de brasileiros, que revela mais do que o uso rasteiro da política. Revela um tipo de crueldade social que se imaginava restrita a políticos do Brasil arcaico, perdidos nos poucos grotões onde ainda vivem, isolados em seus feudos de miséria, uns poucos coronéis distantes dos bons modos da civilização e da modernidade.
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No entanto, o rico interior paulista, repleto de terras devolutas da União griladas por diversas gerações de amigos do rei, tem sido um front permanente dessa guerra patrocinada pela extrema direita brasileira perfilada hoje, mais do que nunca, por trás da bela fachada do agronegócio e sua propalada importância para a balança comercial brasileira. Falar-lhes mal passou a ser de mau alvitre, um insulto a uma espécie de cruzada dourada cujo efeito colateral tem sido a produção de miséria e cadáveres no campo e, por extensão, nas cidades. É nosso mais grave problema social e o mais claramente diagnosticável, mas nem Lula chegou a tanto.
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Assim, na virada de seu último ano de mandato, o presidente parece ter afrouxado o controle sobre a aliança política que lhe permitiu colocar, às custas de não poucos danos, algumas raposas dentro do galinheiro do Planalto. Bastou a revelação do pacote de intenções do Plano Nacional de Direitos Humanos, contudo, para as raposas arreganharem os dentes sem medo, fortalecidos pela hesitação de Lula em enquadrá-los sob o pretexto de evitar crises inevitáveis. A reação do ministro Nelson Jobim, da Defesa, ao PNDH-3, nesse sentido, foi emblemática e, ao mesmo tempo, reveladora da artificialidade dessa convivência entre forças conservadoras e progressistas dentro do governo do PT, um nó político-ideológico a ser desatado durante a campanha eleitoral, não sem traumas para a candidata de Lula, a ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil.
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Com a ajuda de Jobim, a velha sanfona anticomunista voltou a soltar os foles e se engajou nesse desarranjo histórico que tem gerado crises artificiais e um consequente show de péssimo jornalismo. Tocou-se, então, o triste baião anti-Dilma das vivandeiras, a arrastar os pés nas portas dos quartéis e a atiçar as sentinelas com assombros de revanchismo e caça às bruxas, saudosos do obscurantismo de tempos idos – mas, teimosamente, nunca esquecidos –, quando bastava soltar bestas-feras fardadas sobre a sociedade para calá-la. Ao sucumbir à chantagem de Jobim e, por extensão, à dos comandantes militares que lhe devem subordinação e obediência, Lula piscou.
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No lastro da falsa crise militar criada por Jobim, com o auxílio luxuoso de jornalistas amigos, foi a vez de soltar a voz o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, cujo arrivismo político iniciou-se na ditadura militar, à qual serviu como deputado da Arena (célula-tronco do DEM) e presidente do INPS no governo do general Ernesto Geisel, até fazer carreira de ministro nos governos Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso e Lula. Essa volatilidade, no entanto, sempre foi justificada por conta de um festejado “perfil técnico” de Stephanes. Trata-se de um mistério ainda a ser desvendado, não a capacidade técnica, mas as intenções de um representante político do agronegócio dentro governo Lula, uma posição institucional baseada em alinhamento incondicional à Confederação Nacional da Agricu ltura (CNA), comandada pelo senadora Kátia Abreu, do DEM de Tocantins.
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Com Kátia, Stephanes ensaiou um animado jogral e conseguiu, até agora, boicotar a mudança dos índices de produtividade agrícola para fins de reforma agrária – um tiro certeiro no peito do latifúndio, infelizmente, ainda hoje não desferido por Lula. Depois, a dupla partiu para cima do PNDH-3, ambos procupadíssimos com a possibilidade de criação de comitês sociais a serem montados para mediar conflitos agrários deflagrados por ocupações de terra. Os ruralistas liderados por Kátia Abreu e Ronaldo Caiado se arrepiam só de imaginar o fim da tradicional política de reintegração de posse, tocada pelos judiciários e polícias estaduais, como no caso relatado nesta matéria de CartaCapital.
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A dupla viu na proposta um incentivo à violência no campo, quando veria justamente o contrário qualquer menino bem educado nas escolas geridas pelo MST. São meninos crescidos o suficiente para saber muito bem a diferença entre mediadores de verdade e os cassetetes da Polícia Militar.
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O governo Lula já havia conseguido, em 2008, neutralizar um movimento interno, tocado pelo Gabinete de Segurança Institucional, interessado em criminalizar o MST taxando o ato de invasão de terra de ação terrorista. Infelizmente, coisas assimainda vêm da área militar. O texto do projeto foi engavetado pela Casa Civil por obra e graça da ministra Dilma Rousseff.
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Lula, contudo, não quer gastar o último ano de uma era pessoal memorável comprando briga com uma turma que, entre outros trunfos, tem uma bancada de mais de uma centena de congressistas e a simpatia declarada do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes. Assim, distraído, o presidente deixou que Jobim e Stephanes envenenassem o processo político às vésperas das eleições, com óbvios prejuízos para a candidatura Dilma, bem no começo da briga com José Serra, do PSDB, o governador que por ora se ocupa em prender militantes do MST e do PT enquanto toca terror em assentamentos cheios de mulheres e crianças, no interior de São Paulo, com seu aparato de segurança pública.
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O MST existe há 25 anos e é o mais importante movimento social de base da história do Brasil. A crítica à sua concepção socialista e a eventuais desvios de conduta de alguns de seus participantes é, deliberadamente, ultradimensionada no noticiário para passar à sociedade, sobretudo à dos centros urbanos, a impressão de que seus militantes são vândalos nutridos pelo comunismo e outras reflexões sociológicas geniais do gênero.
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A luta do MST é, basicamente, a luta contra o latifúndio e a concentração fundiária nas mãos de uma elite predatória, violenta e vingativa. Essa é a origem de todos os problemas da sociedade brasileira desde a sua fundação, baseada em capitanias hereditárias, em 1532. Nenhum governo teve a coragem necessária, até hoje, para tomar medidas efetivas para acabar com o latifúndio e, assim, encerrar com esse ciclo cruel de concentração de terras no campo brasileiro, responsável pelo inchaço das periferias e pela violência contra trabalhadores rurais, inclusive torturas e assassinatos, com o periódico beneplácito da Justiça e das autoridades constituídas, muitas das quais com campanhas eleitorais financiadas pelos grupos interessados em manter este estado de coisas.
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A luta contra o latifúndio não é a luta contra a propriedade privada, essa relação também foi contruída de forma deliberada e tem como objetivo tirar o verdadeiro foco da questão. A construção desse discurso revelou-se um sofisma baseado na a inversão dos valores em jogo, como em uma charada de um mundo bizarro: a ameaça social seria a invasão (na verdade, a distribuição) de terras, e não a concentração no campo, o latifúndio. E isso é vendido, assim, cru, no horário nobre.
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É uma briga dura, difícil. Veremos se Dilma Rousseff, em cima do palanque, será capaz de comprá-la de novo.
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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

De Imbé para o Cassino

Após 20 dias em Imbé, estou me apresentando de mala e cuia no Cassino, para trabalhar até 1º Março na Operação Verão. Gosto de Rio Grande, e do Cassino. A praia não pode ser comparada com Capão da Canoa, por causa do movimento, mas é seguramente melhor para veranear que Imbé ou Tramandaí. Até mesmo que Torres, na minha modesta opinião. Pena que não vim para veraneio, mas para trabalho. Mas nas folgas certamente vai ser possível molhar os pés no mar cor de Toddynho da maior praia do mundo. Ah, se eu soubesse nadar ...
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