sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

O Lula vai tirar o povo da merda

Pesquisei hoje de manhã no Google, e já havia 58.000 resultados para a expressão "Lula falando palavrão". Olhei somente a primeira página (G1-Globo, IGTV, Folha-Uol, etc), e tom é de desaprovação generalizada. Oh! O presidente falou palavrão! Oh! Um presidente tem que estar à altura do cargo! Oh meu Deus, o mundo vai acabar! Oh, o Lula falou merda!

Eu não sou ufanista (pelo menos, não muito), e vejo defeitos no dito lulismo, como por exemplo, o pragmatismo cooptativo de setores da direita, exercitado como se fosse a única alternativa de governabilidade, e uma tendência forte ao culto à personalidade. Mas desse jeito não dá, tenho que defender o companheiro.

A semana passada foi um débil mental ganhando uma página inteira da Folha para acusar o Lula de ter "estuprado" um menino no tempo em que esteve preso. Depois, as correntes de e-mail, uma acusando o Lula de ser inimigo dos aposentados, e outra de uma suposta "Doutora", que destila palavrões, sob pretexto de comentar o filme-biografia. E a semana termina com essa celeuma porque o Presidente disse literalmente, que vai tirar o povo da merda.

Isso tudo indica o desespero daqueles que já intuíram a derrota do próximo ano. E mais, que a Dilma terá melhor base parlamentar que o Lula, o que permitirá menos espaço para a direita dentro do governo, que será, consequentemente, mais petista. Isso a burguesia brasileira e seus lacaios da mídia não aguentam nem imaginar.

Afinal, eles gostam mesmo é do Presidente-Doutor, que não falava palavrões, mas privatizou (doou) a Vale do Rio Doce por 3,3 bilhões de dólares quando 27 vezes mais. E que nas horas vagas engravidava ou a copeira negra ou a jornalista da Globo, mantendo depois os filhos escondidos, por vinte anos.

Sobre o palavrão presidencial, copiei e colei o texto abaixo do blog Carta Capital, um dos melhores para se ler. Foi escrito por Gilson Cairoli Filho, e eu assino embaixo.


O PRESIDENTE E O PALAVRÃO QUE INCOMODA

Se tratar da língua é tratar de um tema político, a fala sem rodeios do presidente Lula, durante cerimônia de assinatura dos contratos do programa Minha Casa, Minha Vida, no Maranhão, vai encher a seção de cartas de jornais e revistas, além de dar o tom do moralismo seletivo dos grandes articulistas. Fingirão não saber que palavras tidas como chulas são formas lingüísticas ímpares para expressar emoções que permeiam o corpo e os amplos campos das relações sociais. Não está em questão se o emprego se deu em contexto adequado, mas o que move o coro dos “indignados”.

Ao afirmar que "eu não quero saber se o João Castelo é do PSDB. Se o outro é do PFL. Eu não quero saber se é do PT. Eu quero é saber se o povo está na merda e eu quero tirar o povo da merda em que ele se encontra; esse é o dado concreto", Lula tem consciência de que os opositores dirão que desrespeitou a postura pública que deveria manter em face de majestade do cargo que ocupa. Tanto que se antecipa à crítica anunciada: “Amanhã os comentaristas dos grandes jornais vão dizer que o Lula falou um palavrão, mas eu tenho consciência que eles falam mais palavrão do que eu todo dia e tenho consciência de como vive o povo pobre desse país".

Como tem sido colonizada para ter vergonha de ser o que é, uma boa parcela da classe média urbana se apresenta como defensora intransigente da propriedade, da família e do Estado Patrimonial. Confunde governo e salvação, ignora a representação, desconhece direitos sociais e políticos, menosprezando a exploração econômica, embora seja “mobilizável” por campanhas de caridades que reforcem a sua imagem de privilegiadas. Em busca de ilusões perdidas, está disponível para aventuras que realçam a ferocidade dos seus recalques. E qualquer enunciado que apresente um padrão variante é o suficiente para açular o seu ódio de classe.

Pouco lhe importa se campeia a violência, a truculência e a miséria. Em seu ilusório casulo, o que merece relevo é o destempero verbal de um presidente que não segue os padrões dos antigos donos do poder. É de pouca importância se o governo anterior reduziu a zero os empréstimos da Caixa Econômica Federal às autarquias e estatais da área de saneamento básico. Também não lhe tira o sono se a decisão política do tucanato provocou, além da dengue, surtos de cólera, leishmaniose visceral, tifo e disenterias. Ora, doenças resultantes da falta de saneamento não lhe incomodam, pois fezes liquefeitas são desprezíveis. A merda que lhe aflige é aquela que aparece no improviso presidencial como dado concreto.

Para Lula, o descalabro no saneamento é uma tragédia, e, de fato, o é. Por sua história, o presidente faz parte de uma legião de sobreviventes. De um exército que resistiu a séculos de dificuldades imensas, naturais e humanas. Tem orgulho saudável de sua força. Da força desse povo que come mandacaru e capulho verde de algodão e ainda tem a esperança desesperada de querer viver. Isso é coragem, é grandeza. Essa é a merda que a causa engulhos na grande imprensa e nos seus leitores indignados. Mas indignados com o quê, afinal?

Indignados pela existência de erros que se repetem há tempos? Indignados pela impotência de um saber divorciado da dimensão histórica e da responsabilidade social que deveria caber aos centros de ensino que freqüentaram? Indignados pela ameaça, concreta e imediata, da morte, pela fome endêmica e, até bem pouco tempo epidêmica, dos mais miseráveis? Não. O que os ruborizados pelo emprego da palavra "merda" não suportam é a ausência do promotor da "paz social", do garantidor de uma ordem política que lhes oferecia, através do conservadorismo autoritário, uma institucionalidade que muito apreciavam ética e esteticamente. Um simulacro de república feito sob medida.

O problema é que a vestimenta institucional brasileira parece calça curta, fazendo o país caminhar desajeitado, com medo do ridículo. A reforma mais urgente requer produção crescente de cidadania, a criação incessante de sujeitos portadores de direitos e deveres. Em uma sociedade fracionada, essa é a "merda" que ameaça e choca os estamentos mais reacionários: a realidade que não deveria ter emergido com modelagem tão nítida.


Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil.

Visite o Carta Maior, clicando aqui.

Um comentário:

  1. Para o PIG, o "palavrão" do Lula merece maior espaço jornalístico do que o escândalo dos panetones do Arruda/DEM!

    Isso é uma canalhice!

    Prefiro um Presidente que fala palavrão do que um que age como ladrão! Até deu rima...eehhh...

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