* Rudá Ricci
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Nos últimos dez anos o Brasil mergulhou em transformações profundas. Somos a 7ª potência econômica mundial (entre 205 países) e nos transformamos em um país de classe média.
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Mas há mudanças em curso não tão auspiciosas e pouco visíveis aos olhos do grande público. Uma das mais preocupantes é a concentração do orçamento público que resulta no declínio dos municípios como entes federativos autônomos.
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Estamos nos aproximando, em termos da lógica orçamentária pública, do modelo não-federativo do Chile. Trata-se de uma lógica, uma opção política do nosso país. Segundo o Observatório da Equidade do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o maior orçamento per capita municipal do país é 41 vezes maior que o menor orçamento.
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Ainda segundo a mesma fonte, os 20% mais pobres recebem das transferências intragovernamentais, em média, 850 reais per capita e os 20% mais ricos chegam a 1.700 reais per capita. No caso do repasse dos royalties, a relação é de 74 reais per capita para os 20% mais pobres para 142 reais per capita para os 20% mais ricos. E, finalmente, chegamos ao repasse do Fundo de Participação dos Municípios: os 20% mais ricos recebem 289 reais per capita e os 20% mais pobres apenas 190 reais per capita.
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Um modelo cujo vício traça a sorte dos municípios mais pobres. Sorte que está diretamente vinculada ao imenso poder da União. Segundo estudo de François E. J. de Bremaeker, no ano de 2008 a União deteve 54,18% das receitas públicas, os Estados 27,7% e os Municípios 18,12%.
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Na composição das receitas municipais as transferências constitucionais e as voluntárias representaram 68,21% do total de recursos. Fica nítido, portanto, que as transferências de recursos da União e dos governos estaduais têm um peso significativo na vida dos municípios.
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A situação parece ainda mais grave quando observamos o peso da União na sobrevivência dos pequenos municípios.
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As transferências (sejam elas as constitucionais, sejam as voluntárias) superam os 75% das receitas, em média, para Municípios com população até 100 mil habitantes. Uma dependência brutal que obriga prefeitos a recorrerem à convênios com órgãos federais (e, em menor medida, aos governos estaduais) para que possam investir.
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A resultante política é das mais graves para nossa democracia federativa: os prefeitos se parecem cada vez mais, independente da origem partidária ou coloração ideológica¹. São, todos, gerentes de programas federais.
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A inovação municipalista dos anos 1980 e 1990 foi escoando pelos dedos neste início de século XXI. O que sugere uma concepção de Estado indutor do desenvolvimento, um demiurgo nacional, que desconsidera os municípios como capazes de formular.
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O problema é mais grave em pequenos municípios, em municípios rurais e de baixo IDH. Mas também afeta os grandes. Isto porque o montante do endividamento de longo prazo dos municípios, ainda segundo Bramaecker, corresponde a 43,09% do montante da receita orçamentária e a 263,63% do montante da receita tributária.
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O endividamento é maior na medida em que os municípios crescem: 8% em municípios com até 5 mil habitantes, 24% em municípios entre 50 mil e 100 mil habitantes, 50% em municípios entre 500 mil e 1 milhão de habitantes.
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Enfim, esta é mais uma das facetas da demonstração que crescimento econômico não significa desenvolvimento.
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* Pescado no blog De Esquerda em Esquerda, do sociólogo Rudá Ricci.
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¹ O grifo é nosso.
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OBS - Gostaria de saber, só por curiosidade, qual são os percentuais aqui de São Luiz Gonzaga, tanto relacionados ao "peso" das transferências constitucionais no orçamento anual, quando do endividamento do Município.
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