Há uma personagem muito interessante na mitologia grega, a princesa Cassandra, filha do Rei Príamo, de Tróia. Ela era tão linda que Apolo, um dos deuses do Olimpo, encasquetou que iria fazer amor com ela.
Mas a moça fazia charme, e disse que só “ficava” com ele se ganhasse uma recompensa muito especial, um dom divino, por exemplo. Apolo era o Deus dos Oráculos, e não teve dúvidas, lhe concedendo o dom de predizer o futuro.
Não se sabe bem porque, mas depois de ganhar o presente, a princesa não cumpriu o trato, e deu um cano no Apolo, apesar dele ser belo, poderoso, e desejado por nove entre dez mulheres da época.
Como era de se esperar, Apolo ficou furioso, mas os dons divinos, uma vez concedidos, não podiam mais ser retirados. Não podendo cancelar o presente, ele se vingou de outra maneira, acrescentando ao dom uma maldição: ninguém acreditaria em nada do que ela previsse.
Assim, ela falava tudo o que iria acontecer, com grande precisão, mas ninguém acreditava. Acabou sendo tratada como louca por todos, até mesmo por seus pais. Quando seu irmão Páris partiu para Esparta, Cassandra avisou que ele iria raptar Helena, a mulher do Menelau, o que causaria uma guerra de mais de dez anos com os gregos, no final da qual Tróia seria destruída. E ninguém deu bola.
Depois, já no final da guerra, quando os gregos fingiram que foram embora e deixaram um imenso cavalo de madeira nos portões de Tróia, ela ficou rouca de tanto gritar que era uma armadilha, que não era para botarem o cavalo para dentro das muralhas, pois estava recheado de inimigos.
De novo ninguém acreditou no que dizia a “louca”, e levaram o cavalo para o centro da cidade, festejando o que acreditavam ser a desistência dos gregos. De noite, os guerreiros gregos que estavam dentro do cavalo saíram, mataram os sentinelas, e abriram os portões da cidade para o restante do seu exército. O final da história é conhecido por todos.
Descrédito parecido sofreram os primeiros ambientalistas, ao avisar que nosso estilo de vida, especialmente pelo desmatamento e dependência de combustíveis fósseis, acabaria trazendo sérios problemas para o futuro do planeta.
Pioneiros como Lutzemberguer, os militantes do Greenpeace, WWF, e outros tantos, foram transformados em Cassandras pela grande mídia, que, quando veiculava suas opiniões, o fazia sempre de forma a que obtivessem pouca ou nenhuma credibilidade. Como se fossem apenas folclóricos alarmistas.
Isso ocorria, certamente, porque cuidados ambientais "excessivos" poderiam trazer prejuízos aos negócios. Ninguém acreditou nos avisos, e deu no que deu.
Hoje, a Organização das Nações Unidas avisa ao mundo que já passamos dos limites suportáveis pela natureza. Há um novo, e gigantesco cavalo, esperando que nossa omissão o carregue para o interior das muralhas. Dentro dele, estão à espreita o aquecimento global, o derretimento nos pólos, as alterações climáticas, as inundações. São inimigos à espreita, prontos para descer, e abrir os portões para a fome, a doença e a miséria.
Tróia caiu porque não acreditou nos avisos, e depois de anos em estado de alerta, relaxou às cautelas e adormeceu. Talvez a humanidade ainda possa fazer o contrário, e após décadas de desatenção, possa confiar no que é dito pelos “alarmistas”, acordar e agir. A hora é de acreditar nos “loucos”.
Publiquei o texto acima no Jornal Folha da Cidade, de Dom Pedrito, em 24.02.2007. Reproduzi aqui no blog, com pequenas alterações, porque estou com uma pulga atrás da orelha com a transposição do São Francisco, o abandono do etanol em favor do petróleo (depois da descoberta do Pré-Sal), e a MP da Grilagem na Amazônia. Queira Deus que o companheiro Lula esteja dando a devido atenção para os impactos ambientais dessas três questões.
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Boa Zé Renato, ótimo comentário. Abraço do amigo Henrique.
ResponderExcluirmuito bom!!!
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