Sábado, fui na inauguração do Monumento a Jayme Caetano Braun. Estava ali distraído, ouvindo os discursos, assistindo as pajadas, e a apresentação do Pedro Ortaça, quando avistei a Dona Judite Dutra, no meio da multidão.
Como onde está a Judite, geralmente está o Olívio, dei mais uma olhada pelo povo, e vi o Galo Missioneiro entretido numa prosa com o Flávio Bettanin, o Bohn Gass, e outras pessoas.
Fiquei olhando de longe e analisando ...
O Olívio já ocupou os cargos mais importantes que um político pode ocupar. Líder sindical, Presidente do PT, Deputado Federal, Prefeito de Porto Alegre, Ministro, Governador. Mas nem por isso deixou de ser uma pessoa simples, que não precisa de aparato para andar na rua, e nem de um esquadrão de brigadianos para cuidar da sua casa.
Lembro, como se fosse hoje, da primeira vez que soube da sua existência, há exatos trinta anos, nesta mesma época do ano. Primavera de 1979, eu adolescente. Cheguei em casa para almoçar, e já estavam na mesa a mãe e a Dona Maria, que trabalhava lá uma vez por semana, como diarista.
A Dona Maria, também conhecida como “Marica”, era uma dessas pessoas que encantam a gente. Naquela época, ela estava freqüentando o Mobral, pois queria muito aprender a ler e escrever. De conversa fácil, comunicativa, trabalhou anos conosco, e todo mundo a adorava, especialmente porque sempre tinha uma história para contar, um palpite para dar, e estava sempre alegre.
Mas a Dona Maria, nesse dia, estava triste, contando alguma coisa para a mãe. Lembro das palavras exatas dela: “Pois é, e agora o Caia tá preso”.
Perguntei automaticamente quem era esse “Caia”, e o que ele tinha feito. Ela só disse que era um sobrinho, e ficou calada. Daí a mãe me disse: “O sobrinho dela é o Olívio Dutra, e está preso porque está comandando a greve dos bancários”.
Eu fiquei impressionado. Então o Olívio Dutra, da televisão, que o Lula (que já havia sido preso quatro vezes seguidas por liderar greves em São Paulo) veio visitar e prestar solidariedade, aquele bigodudo que não tinha medo da ditadura, e liderava milhares de bancários em greve, era de São Luiz! E além disso, de uma família pobre, da periferia. Sobrinho da Dona Maria!
Aprendi uma lição naquele dia, que serviu para muitas coisas. A lição de que, quando queremos, podemos tomar o destino em nossas mãos. E se o Olívio fez isso, na política, e se transformou em uma pessoa importante, eu também podia fazer qualquer coisa, contanto que tomasse iniciativa. Mais ou menos como naquela música do Raul Seixas, “basta ser sincero e desejar profundo, e você será capaz de sacudir o mundo”.
Mas naquele dia eu fiquei muito curioso, querendo saber mais do Olívio, daí a Dona Maria contou algumas histórias dele, que trabalhou no Banrisul daqui, e foi transferido por exigência de um prefeito que o julgava “perigoso” demais.
Em 1986, tive que ir embora para procurar emprego. Mas uma das últimas coisas que fiz foi participar da carreata de cinco carros, que comemorou a eleição do Olívio para Deputado. Fui de carona no fusca azul do meu amigo Mosquitão Scolari.
Em 1988, já em Porto Alegre, vibrei nos comícios, e mais ainda quando ele, que na véspera das eleições era dado nas pesquisas como estando em 4º lugar, ganhou a Prefeitura, e inaugurou um ciclo de dezesseis anos de governo democrático e popular.
Por inúmeras vezes, fui um daqueles anônimos que carregavam bandeiras para comícios e mobilizações, e até engrossei a militância que ajudou na mobilização para garantir a intervenção no transporte coletivo, sua primeira medida impactante na Prefeitura.
Como bancário, convivi no Sindicato com vários companheiros que foram contemporâneos de Olívio, como o Felipe Nogueira, o Paulo de Tarso, o Fonseca. Gostava de ouvir histórias da greve de 79, pois apesar de ser, na época, do PCdoB, sempre vislumbrei no Olívio uma referência de como um militante deve se comportar.
Em 1998, tive a alegria de finalmente ver o Olívio tomando posse, como Governador. Dessa vez, assisti pela televisão. Estavam lá o Seu Cassiano e a Dona Amélia. Não vi a Dona Maria, pois a televisão não mostrava muita coisa, e não sei se ela já não tinha falecido. De qualquer forma, me contaram que à Brasília, pelo menos, ela tinha ido, na posse do Olívio como Deputado. Orgulhosa e feliz.
Uma coisa eu digo: depois desses anos todos, continuo com a mesma admiração de adolescente. É muito bonito não ter sido decepcionado nenhuma vez nesses trinta anos.
É bonito saber que o Olívio ainda mora no mesmo apartamento, que comprou e mobiliou com seu próprio e, certamente, escasso dinheiro de bancário.
É bonito saber que enquanto muitos heróis morreram de overdose (de poder), o meu está aí, limpo e puro.
É bonito ver o Olívio conversando com seu povo.
Desculpem, mas o Olívio é o cara.
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A dignidade, a honestidade, a decência do Olívio são algo que nem algum eventual adversário político pode ter a coragem de contestar. Ele e dona Judite são duas fabulosas figuras humanas e que nos fazem acreditar que esse mundo ainda tem jeito. Acho que foi Lula que disse, e fez grande justiça nisso, que se existirem cinco pessoas honestas nesse país, uma delas é Olivio Dutra.Dá orgulho ser contemporâneo e compartilhar da mesma origem missioneira desse grande e verdadeiro gaúcho. Adão Paiani
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