quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Sobre Direitos Humanos

A propósito do Plano Nacional de Direitos Humanos, tenho a declarar que ou a favor. Na íntegra, e ipsis literis.

Neste meu involuntário exílio, com escassez de acesso à internet, tenho acompanhado o tema como posso, na grande mídia, e como outros tantos, fiquei indignado com a forma como o tema foi manipulado. No Jornal Nacional, por exemplo, foi brincadeira a "comparação" do plano do FHC com o atual, que seria "da Dilma". Assisti também na Band, e em outro canal que não lembro, tudo na mesma linha de desinformação.

O que vi na Globo é que a Igreja teria entrado em pânico, porque o Plano sugere a descriminação do aborto. O agrobussnes ficou furioso, porque o plano sugere algumas medidas acautelatórias, antes da reintegração de posse.

As empresas de comunicação, por sua vez, reagiram relacionando o Plano, falsamente, ao retorno da Censura. Sobre isso, está passando até uma propaganda, muitíssimo bem feita, sobre o perigo de ressuscitarem o "monstro da censura". Uma peça publicitária de primeira. Se eu tivesse um publicitário do tipo que bolou essa peça, acho que não teria perdido a eleição em Dom Pedrito.

E por último, mas não menos importante, os milicos de pijama e seu bom interlocutor Jobim, ficaram encagaçados com a proposta de criação da Comissão da Verdade.

Sou a favor da descriminação do aborto. Sou a favor da reforma agrária. Sou contra o monopólio das comunicações. E sou a favor de que se esclareçam os crimes praticados pelos agentes da ditadura, mesmo sabendo que haverá grande debate jurídico sobre a possibilidade de serem punidos penalmente. Pessoalmente, eu acho que a resposta do Supremo seria negativa, nesse sentido.

Bueno, nessa linha, quero então reproduzir adiante um texto excelente do Rodrigo Viana sobre a Comissão da Verdade, publicado no seu excelente blog "Escrivinhador" (atalho ao lado). Lá vai:

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Os cafajestes não querem a Comissão de Verdade

Numa atitude cafajeste, alguns setores da sociedade brasileira apresentam a “proposta” de – ao se instituir uma Comissão de Verdade sobre a ditadura – investigar-se “os dois lados”. Não faz o menor sentido.

É como se, ao fim do nazismo, alguém propusesse: “ok, vamos investigar os carrascos, mas é preciso levar ao banco dos réus também os judeus que resistiram ao legítimo regime nazista”. Estou a exagerar? Não creio.

Os militantes de esquerda já foram punidos: alguns julgados, muitos presos e torturados, vários executados, encarcerados. Falar em “investigar os dois lados” é torturar de novo os que sobreviveram, é torturar a memória dos que se foram. Isso é cafajestagem. Não há outro nome.

É preciso investigar os que seguem impunes. Assassinos e torturadores. A Justiça poderá puni-los? Talvez. Mas o principal é estabelecer a verdade. O resto é consequência.

Respeito aqueles que – como o professor Paulo Brossard, por exemplo – manifestam sua opinião contra a revisão da “Lei de Anistia”. Ex-ministro, humanista, Brossard não apela para a cafajestagem. Ele acha que a lei é fato consumado e que impede punição aos que atuaram na ditadura.

Humildemente, eu que não sou jurista, mas já entrevistei muita gente sobre esse assunto, gostaria de lembrar: a “Lei de Anistia” não precisa ser abolida para que a Comissão de Verdade se estabeleça.

A Comissão não vai punir ninguém. Vai, simplesmente, fazer um relatório oficial – conduzido por representantes da sociedade, mas com aval do Estado brasileiro – sobre as atrocidades cometidas por agentes do Estado durante a ditadura. A Comissão vai dizer: “fulano foi preso em tal circunstância, foi preso em tal instalação militar, torturado sob as ordens do comandante tal e qual, desapareceu no dia tal, sabe-se que o corpo foi levado para tal vala comum etc.”

É uma satisfação às famílias. É um acerto de contas com a memória do país. Na Argentina, no Chile (e também na África do Sul, ao fim do Apartheid) comissões desse tipo se estabeleceram.

No Brasil, o Estado omitiu-se. Coube a Dom Paulo Evaristo Arns (então arcebispo de São Paulo, até hoje detestado por parte da elite brasileira, por ter-se posicionado contras as violações e abusos) comandar a investigação que resultou no relatório “Brasil, Nunca Mais”.

Não foi o Estado que fez a investigação. Mas um grupo da sociedade civil. Sem acesso a arquivos, com todas as limitações que se possa imaginar. O Estado brasileiro precisa prestar contas do que se passou.

As Forças Armadas, inclusive, não merecem carregar esse fardo do passado. Sem dar nomes, sem um acerto de contas, o passado vai voltar a assombrar o Brasil e os militares (e a imensa maioria deles não tem responsabilidade pelos atos cometidos durante a ditadura).

A Comissão é necessária, é justa, está baseada em boas experiências internacionais. Não há nada de "revanchismo" nisso. Revanchismo seria pegar os torturadores e pendurá-los no pau-de-arara, ou arrancar-lhes as unhas e dentes. Não é isso que se propõe. Mas um acerto de contas civilizado.

Pode-se entender, ao fim de tudo, que não se poderá punir ninguém. Essa é outra discussão, que se dá no STF. A OAB entrou com uma ação, pedindo que o Supremo decida: torturador pode ou não ser punido? A Lei de Anistia protege os torturadores?

Há quem entenda que não. O argumento é o seguinte: tortura é crime contra a Humanidade, imprescritível, e o Brasil assinou tratados internacionais nesse sentido; portanto, Lei nenhuma pode valer mais do que tratados internacionais. O STF vai decidir.

Enquanto o STF não decide, algumas famílias usam uma estratégia inteligente. A família Teles, por exemplo, entrou com uma ação declaratória, na Justiça, pedindo que o coronel Brilhante Ustra fosse declarado responsável por torturas quando comandou DOI-CODI em São Paulo. O juiz, em primeira instância, deu ganho à família.

Vejam: é uma ação cível. Não se trata (por hora) de punir Ustra (até porque ele poderia trancar a ação usando justamente a "Lei de Anistia"). O texto sobre a vitória contra Ustra foi o primeiro a ser publicado nesse blog. Sinto orgulho de ter divulgado a informação, em primeira mão, como se pode ler aqui.

Imaginemos que o STF entenda que torturador não pode ser punido penalmente. Seria lamentável. Mas teríamos que respeitar. Ainda assim, a Comissão de Verdade poderia concluir seu trabalho. E, ao final, dezenas de “ações declaratórias” (como a ajuizada pela família Teles) poderiam ser abertas, com base no relatório da comissão.

As famílias têm sido ignoradas pela grande imprensa no Brasil. Os jornais estão ocupados em fustigar o presidente Lula - acusando o governo de “revanchismo” nesse episódio.

Entidades que representam as famílias lançaram uma carta, no fim do ano, no Rio. É uma espécie de roteiro para que a Comissão da Verdade funcione bem. Publico o principal trecho, a seguir ....

Para ler o restante do texto, mais especificamente, a Carta da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, Grupo tortura Nunca Mais/RJ e Cejil, visite o Escrivinhador.

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N.B. (Nota do blogueiro): Dei uma mexidinha na formatação do texto original, para caber melhor no meu blog, mas acho que não estraguei muito. Ao Rodrigo Viana, peço que desculpe o abuso.

N.B. 2 – A ilustração, copiei e colei do Blogleone....

Um comentário:

  1. É que ,por essas plagas até o raio da mesquinha democracia burguesa é difícil de emplacar. Os coronéis do norte até o sul, irmanados com a oligarquia midiática, mandam e desmandam neste país, inclusive com apoio da Suprema Corte, comandada por um tucano de alta plumagem. Países como Uruguai, Argentina e Chile que já passaram as suas histórias de ditaduras a limpo nos deixam morrendo de inveja. Os militares facínoras, inativos ou não, ganhando altos salários riem à toa. Perseguiram, torturaram e mataram e dizem que aqueles que resistiram bravamente a esta violência são terroristas. E o LULA o que faz que não demite este ministro Nelson Jobim, boneco de ventríloco de milico que junto com Stephanis da agricultura forma uma dobradinha conservadora que dá nojo. Pra onde vai esse governo com mais este recuo?

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